quinta-feira, 1 de março de 2012

Haja Coração

Começou assim. Primeiro foi um. Médico respeitado. Se conheceram em uma festa. Trocaram telefones. Saíram algumas vezes. Acabaram ficando. Ela tinha 32. Ele, 54. Era um amor confortável. Feito de restaurantes finos e hotéis de luxo. Se o sexo não era lá essas coisas, as gentilezas compensavam. Ele a respeitava. Não perguntava o que ela fazia, que horas voltava. Se encontravam duas vezes por semana. Religiosamente. Nos outros dias, nem se falavam. Parecia perfeito.

Parecia. Mas faltava algo. Aí aconteceu. Não se sabe se foi o excesso de espaço. Ou a diferença de idade. Mas numa quarta-feira, meio chuvosa, ela conheceu o outro. Era advogado. Bem apessoado. 34 anos. O interesse foi mútuo. E instantâneo. Ficaram e dormiram juntos logo na primeira noite. E começaram a namorar. Tinham muito a ver um com o outro. Gostavam das mesmas coisas, faziam os mesmos programas. Um casal quase perfeito.

Quase. Porque ela, claro, não abandonou o Médico. Pelo contrário, estava cada vez mais firme. Só que agora, tomava mais cuidados. Sua agenda era cuidadosamente planejada. Ela dava exatamente a mesma atenção aos dois. E, por via das dúvidas, evitava que ambos frequentassem sua casa. Como morava com duas amigas, era fácil manipular. Dizia que elas falavam demais. Que não queria ter sua vida vasculhada. E desse modo, levava a situação.

Estava feliz como poucas vezes na vida. Cada um completava um lado. O Médico era cortês, educado, charmoso. Quase um Richard Gere. Já o Advogado compreendia sua alma. Entendia seus sentimentos. Com ele, se sentia totalmente à vontade. E o sexo era mágico. Espiritual. Não faltava mais nada.

Quer dizer, era isso que ela pensava. Até uma noite, em que perdeu a chave e foi dormir na casa de uma amiga. E conheceu o irmão dela. Estudante de arquitetura. 24 anos. Um xuxu. Tentou evitar. Mas os olhares acabaram se cruzando. Ela sentiu um arrepio. Quando percebeu, já estavam sozinhos. A amiga dormia há tempos. Ela não aguentou. Se agarraram ali mesmo. E marcaram a transa para a noite seguinte. Na casa dela.

Como os outros dois não iam lá, a barra estava limpa. E a performance superou as expectativas. Ele era a virilidade em pessoa. Energia pura. Testosterona acumulada. Para evitar problemas, contou sobre os outros dois. E combinou que ele iria preencher os espaços vazios. Literalmente. Sempre que houvesse uma oportunidade, ela ligaria. E ele apareceria.

Agora sim. Ela estava realizada. Tudo bem que às vezes passava sufoco. Como no dia que o Advogado fez uma visita surpresa. O Arquiteto ficou quase uma hora embaixo da cama. Ou quando parou o carro do lado do Médico. Com o Advogado no banco do passageiro. Mas não importava. Gostava dos três.

Nessa toada se passaram seis meses. Tudo às mil maravilhas. Parecia que ia durar para sempre. Foi quando ela começou a misturar as coisas. O Médico queria construir uma casa. Sem perceber, ela indicou o escritório onde o Arquiteto trabalhava. Por distração também, no dia que o Advogado se machucou jogando bola, ela comentou do Médico, especialista em joelhos. Para finalizar, o Arquiteto tinha uma ação na justiça. Mais uma vez, ela vacilou e acabou passando o telefone do Advogado.

Quando caiu em si, o pior havia acontecido. Eles ficaram amigos. Nem desconfiavam da situação. Mas de alguma forma estavam conectados. Tinham algo em comum. Os três só falavam nos novos companheiros. Pareciam crianças. Ela redobrou os cuidados. Vivia tensa. Mas só perdeu o controle mesmo naquela quinta-feira.

Acordou carente. Tinha três namorados. Mas ainda assim se sentia esquecida, abandonada. Passou o dia pensando com qual gostaria de encontrar. Não conseguia decidir. Queria os três. Resolveu ir por ordem de chegada. Ligou para o Médico. Não podia. Tentou o Advogado. Também ocupado. O Arquiteto? Resposta negativa. Então a ficha caiu. Eles a trocaram por eles mesmos. O sangue ferveu. Nem pensou nas consequências. Saiu do jeito que estava. Encontrou-os em um bar. Foi um escândalo. Não deixou que eles dissessem sequer uma palavra. Aos gritos, terminou com os três ao mesmo tempo.

1 Comments:

Anonymous Flavia said...

A mulher

Mulher dessas
Desconstruindo
A vida
Pelo tempo todo
De corpo inteiro

2:54 PM  

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